sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Concerto n.1 para Faca e Oboé





observações sobre o livro "5 bonecas de olhos vazados", de Rubens Francisco Lucchetti, após a leitura.

Um narrador que passeia, feito drone, pelas cenas de um livro, perscrutando as personagens e suas ações, insinuando-se por entre os parágrafos, dirigindo-se ora ao protagonista, ora aos leitores. Esse intenso personagem, que é o próprio narrador, revela ao longo das páginas seus medos, angústias de escrita, gostos de arte e sua história como leitor. Personagens importantes de outras obras do mesmo autor criam um caso exemplar do que poderíamos chamar de auto-intertextualidade (poucos escritores conseguem fazer isso com destreza). A incrível capacidade de transformar em ficção a realidade e a realidade em ficção. Terror/suspense/policial em pura fricção. Personagem/narrador/voyeur/leitor, Rubens se autonomeia pelo menos uma vez ao longo do livro “5 bonecas de olhos vazados” - (trata-se de uma referência à realidade ou de mais um elemento ficcional falando de um outro personagem que é o próprio Lucchetti? Tudo parece se fazer imagem e ficção). Passagens de sua vida são reveladas no livro, mas onde começa e onde termina a realidade? O romance/jogo acontece em meio a uma série de referências à cultura literária e cinematográfica, clássica e popular, e entre ilustrações que fazem lembrar a criativa relação texto/imagem que encontramos em livros como “A misteriosa chama da rainha Loana”, de Umberto Eco, uma homenagem à própria literatura. Um livro para ser lido ao som eletrônico de Daniel Piquê, aliás personagem do livro. Outras referências musicais são apontadas ao longo da trama, basta seguir as sugestões do próprio autor. Curiosamente o tempo do livro parece acompanhar o tempo das músicas. Procedimento criado de forma consciente ou inconsciente? Não importa. Se há ou não uma planta-baixa para a obra, o que importa é que Rubens Francisco Lucchetti se revela um mestre na arquitetura literária. Provavelmente o livro mais bem escrito de sua vida. Rizomático, o narrador divide com os leitores os múltiplos caminhos a serem seguidos durante a própria escrita. Capítulos como o do Sonho – um dos últimos do livro - são dignos de uma obra prima. Segundo Lucchetti, “5 bonecas de olhos vazados” é uma homenagem à Mary Shelley e sua obra Frankenstein. "5 bonecas de olhos vazados" (que nome maravilhoso) é um dos livros mais curiosos que li nos últimos anos. Ele ainda vai dar muito o que falar!
obrigado, mestre!

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