terça-feira, 16 de março de 2010

O Dia Mastroianni


Misture o Panamérica, do Zé Agrippino, o Agora é que são Elas, do Leminski, A Doce Vida e Ensaio de Orquestra, de Fellini, e terás alguma coisa quase tão louca quanto o romance O Dia Mastroianni, de João Paulo Cuenca. A diferença é que o Agrippino é o Agrippino, o Leminski é o Leminski e o Fellini é o Fellini. Não estou querendo comparar esses grandes para provar que Cuenca é grande ou pequeno. Esse lance de grande e pequeno é muito sexual e pouco literário.

O fato é que o livro foi saudado como uma das coisas mais incríveis da literatura brasileira dos últimos tempos. Basta ler um fragmento da crítica escrita por Márcio Renato dos Santos, publicada no jornal Rascunho: “O dia Mastroianni é um livro absurda e absolutamente indispensável. Para pensar o presente. E chorar pelo futuro. E ter vontade de viver no passado. Romance com brilho, irônico, escrito com fúria e força raras - momento raro de força nestes tempos insossos em que qualquer Pose se quer um gênio inédito da raça. O dia Mastroianni é prosa para ler - e reler, rindo, para gargalhar. E, então, se dar conta de que João Paulo Cuenca é um dos grandes nomes da literatura brasileira contemporânea”.
Tudo bem que a crítica ao mundo das celebridades é interessante. Cuenca consegue abalar as estruturas narrativas tradicionais. Basta pensar nos capítulos que permeiam a “história” propriamente dita. Tais passagens comentam a própria história, como se o texto fosse um work-in-progress comentado ao longo do livro. Assim, os clichês são propositais. O cinema acaba se transformando em um dos personagens principais, e não é difícil ler o livro imaginando o absurdo de uma cena felliniana, o sorrido amarelo de Mastroianni, um bolero ao fundo, e lindas mulheres que deixam de ser excitantes quando abrem a boca. Só não acho que esse livro seja tão fundamental assim para se ler a literatura brasileira contemporânea. Não preciso dele para perceber como vão as coisas. Por isso, penso que a importância do livro se dá mais pela graça das cenas, pelo irônico beirando o sarcástico, pelo absurdo quase surrealista, misturado com gim e tônica. As pessoas quando lêem uma obra geralmente ficam tentando encontrar valores, críticas, alguma coisa que possa justificar a sua existência como algo importante e digno de nota. Prefiro ler o livro de outra maneira, ler deseducadamente, como escreve Cuenca, DESEDUCADAMENTE. Cada livro nos ensina a lê-lo. Encanta-me a provocação, as frases impensáveis, os cortes cinematográficos, e a patetice dos dandys pintados por Cuenca. Lembrei imediatamente das maluquices de Zé Agrippino, que provavelmente deve fazer parte do paideuma de Cuenca. As festas, o sexo, as bebidas, uma cena pulando loucamente para a outra, como não pensar em Agora é que São Elas e algumas viagens literárias de Bukowski. Antes de falar sobre o mundo e criticar a sociedade do espetáculo, o livro de Cuenca fala sobre o cinema e sobre a própria literatura. É como se o autor – que se despedaça a medida que se confunde com os personagens – pretendesse dar continuidade, mas não numa linha diacrônica, à prosa experimental brasileira. O narrador fala, fala, mas nada acontece, como em Catatau, de Leminski. Assim, o que está em jogo não é necessariamente a in-ação do playboy, e consequentemente do mundo medíocre que o rodeia, mas uma in-ação, que se converte em ação ao pensar a própria literatura, a ausência de caminhos – aporia. É preciso ter coragem para escrever um livro desses.


c.moreira

Um comentário:

Gabriela Galvão disse...

Caio, vim ver seu blogue, gostei mt da estética, mas soh vou poder ler daqi um tempo, pq estou c dificuldade d acesso, eh sempre mt rápido.

Bom, mas eu qero voltar.


Abraço e bisous