Panorada do Rio de Janeiro: Ponta do Calabouço séc. XIX Henry Chamberlain
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Ao folhear as páginas do livro Entrevistando a Arte, organizado pela professora Ivanira Tereza Dias Olbertz, vem-me à lembrança aqueles panoramas do Rio de Janeiro, confeccionados no tempo do Império por pintores como Henry Chamberlain, Dom Miguel Ângelo Blasco, Emeric Essex Vidal, Johan Jakob Steinmann, Félix-Émile Taunay, Eugenio Rodriguez, entre outros. Os panoramas, que estiveram muito em voga no século XIX, eram pinturas que almejavam retratar uma vista abrangente, quase sempre de uma cidade, normalmente vista de um ponto elevado e distante. Até onde se sabe, o termo “panorama”, do grego “pan” (total) e “órama” (vista), foi cunhado pelo pintor irlandês Robert Barker. María Negroni, em seu livro Pequeño Mundo Ilustrado, observa que o mecanismo desse tipo de pintura responde ao desejo de uma “visão” total, desde as alturas, como aquela que Deus poderia ter. Nessas imagens, os espectadores buscavam a máxima ilusão, algo assim como uma paisagem ideal onde a memória (uma memória criada) pudesse melhorar a experiência, embelezando-a. É nesse sentido que leio o livro de Ivanira, como um baú cuja memória é capaz não só de produzir um conhecimento sobre a história da nossa arte, mas também - por meio dessa experiência -, aproximar o leitor da beleza criada pelos nossos artistas e do prazer que ela pode suscitar.
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foto panorâmica do Rio de Janeiro (2012) acervo pessoal Caio Moreira
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No caso do livro Entrevistando a arte, não estamos diante de um panorama da cidade, mas de um painel bastante ilustrativo das artes plásticas nela produzidas. Ao mirar suas páginas, o leitor possivelmente terá uma experiência semelhante àquela do espectador que se coloca diante de um panorama, tendo, nesse caso, a possibilidade de vislumbrar um conjunto formado pelos mais variados estilos, técnicas e temáticas. Dos pinheiros de Amadeu Bona aos quadros azuis de Renato Ruschel, passando pelo ultra-realismo de Pedro Girardelo Neto e pelo traço inconfundível de Ulysses Teixeira, só para citar alguns, nossa pintura é fruto de um ambiente cultural altamente desenvolvido.
A obra de Ivanira é o resultado de uma pesquisa de fôlego que, ao longo de anos de gestação, foi ganhando a forma que vemos agora, a de um baú repleto de pedras preciosas lapidadas por artistas que, ou nasceram em Porto União da Vitória, ou fizeram de nossa terra a sua legítima morada.
O livro já se firmou como um dos estudos mais significativos da história da cultura de nossas cidades. A obra, em geral, é assim composta: A autora apresenta a biografia de um determinado pintor e, na sequência, insere algumas imagens por ele pintadas.
De artistas mais consignados pela crítica, como Erich Will, Eugênio Schuwaloff e o já citado Amadeu Bona, até pintores contemporâneos ainda desconhecidos do grande público, a antologia Entrevistando a arte convida o leitor a entrar em um espaço que poderíamos chamar aqui de “museu imaginário”, um museu que consegue reunir mais de 3000 fotografias de produções artísticas, ou seja, formar um banco de imagens cuja iconografia, reunida de forma inédita, será de grande interesse e valia para as futuras gerações, que terão a oportunidade de conhecer o trabalho de nossos artistas até agora pouco documentado. Preenche, assim, uma lacuna nos estudos de arquivo em nossas cidades, arquivo esse fragilmente preservado. A obra, nesse sentido, salva um passado artístico até então fadado a ser obliterado da história, ou destinado apenas a ornamentar de forma anônima as paredes de nossas casas.
O livro satisfaz a fantasia de possuirmos e carregarmos debaixo do braço todas as pinturas nele registradas, já que guarda em miniatura boa parte da produção local. Seria, assim, uma espécie de caixa mágica que faz da coleção um instrumento de conhecimento e prazer. Logo, a satisfação de vê-lo publicado equivale ao êxtase do pintor que conclui seu trabalho, entregando-o ao público com o sentimento de dever cumprido. Vem-me a sentença: Esta obra de obras só poderia ter nascido das mãos e da imaginação de uma pesquisadora competente e apaixonada pela arte como a Ivanira Tereza Dias Olbertz.
Penso na importância desta obra não só para o presente, que já tratou de consigná-la pelo desejo homérico de salvar o passado, mas para o futuro, que terá em mãos um trabalho de inestimável valor, o registro fundamental de nossa produção artística. Se já é agora, imagine que bela pérola este volume será daqui há cem ou duzentos anos, quando o agora será mera miragem ou vaga lembrança.
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