quarta-feira, 11 de maio de 2016

Na corda bamba


A corda bamba, onde o equilibrista exerce a sua atividade, supõe sempre um risco, o de cair no chão, encerrando o espetáculo de uma maneira inesperada. Sempre se espera que o trapezista assuma todos os riscos e chegue até o final da corda ileso e vencedor. Mas e se a corda não figurar uma passagem, uma linha reta entre dois pontos, mas sim o território desdobrado do artista, que opta não por atravessar o caminho, deixando para trás o perigo, mas por atrasar ao máximo a sua chegada, convivendo conscientemente com o perigo da queda iminente?
 Dois argumentos poderiam confundir-se nesse gesto arriscado de manter-se na corda bamba. O primeiro é o de que o trabalho arriscado pode deixar de ser um espetáculo, transformando-se em algo banal. Todos poderiam dizer que o trapezista está acostumado a realizar esse tipo de atividade, que grande parte dos artistas de sua época especializaram-se neste tipo de atividade, e que ele não consegue mais convencer a platéia da que esse movimento é digno do apreço dos amantes dessa arte. Esse seria o pior acidente de sua carreira. A repetição desse perigo transformou-o no banal. A conclusão seria a de que a corda bamba derrubou o poeta, e que se ele sobreviveu, deve procurar repensar o seu trabalho. O outro argumento incidiria sobre a ideia de que a opção pela corda bamba não é ingênua. A queda do trapezista foi apenas simulada. O trapezista mantém o equilíbrio, para o infortúnio daqueles que esperavam ansiosamente o seu suplício. O poeta simula o gesto banal do trajeto, enganando o leitor desatento, que não percebe que se manter na corda bamba nunca deixará de ser um perigo. A queda é apenas pretexto para demonstrar que o poeta está consciente dos seus movimentos, e que sabe que se cair sairá ileso.         

(texto de Maria de Fátima Marcondes)

    

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