segunda-feira, 25 de março de 2013

da série: Esquinas


Os dois subiam. Ela, a rua Costa Carvalho. Ele, a avenida Professora Amazília. Ela parou para ler a placa da lavanderia. Perdeu 15 segundos para anotar o número: 3523-3776. Verão, fim de tarde, horário novo, mas velha a solidão. Passadas das 18h, sol alto e ainda de céu azul e rosado. (Esquina: Ângulo, formado por dois planos que se cortam. Canto exterior de edifício, caixa, etc. Ângulo de rua: ao dobrar de uma esquina. Etimologia: do castelhano esquina, e provavelmente do gótico Skina). Ela quase cruzou ali com o amor de sua vida. Ela, com 43 anos de esperança. Se tivesse passado pela esquina 15 segundos antes, teria informado as horas para ele, 45 anos, solteiro, sozinho. Eles teriam conversado por cerca de 5 minutos. Ele a teria convidado para conhecer a sua loja e depois a chamaria para sair. E depois tudo o mais aconteceria naturalmente, como essas coisas acontecem. Acontece que ela se atrasou 15 segundos, ou teria ele se adiantado? Se, por sua vez, ele tivesse parado para ajuntar os dejetos orgânicos de seu cão, apanhado no pet shop, teria como ela se atrasado, estando, assim, na hora exata de ser feliz. Ele teria esbarrado com ela na esquina depois de 15 segundos, pois este seria o tempo necessário para que ela lesse a placa e anotasse o número de telefone da lavanderia e para que ele cumprisse uma obrigação, a dos bons modos sociais. Se ela não tivesse parado ou se estivesse com a sua máquina de lavar funcionando, e não no conserto, como de fato estava, tudo também seria diferente. Se a alma e as roupas estivessem lavadas, os 15 segundos talvez fossem poupados, permitindo que a história diferisse para o contento de todos. O encontro que não aconteceu, o destino alterado previamente pelos astros, o acaso, ou apenas a placa da lavanderia (ela bem poderia não ter existido), ou a irresponsabilidade do dono de um cão e seus dejetos, foram sem saber o motivo ou apenas um deles para que ele continuasse na loja e ela dando aulas de inglês em um Colégio Estadual. Ela passou com dois livros e um lápis na mão. Ele trazendo o fiel escudeiro Adelmo. Mas esses dados não importam porque ela não o viu, nem ele a vislumbrou. Assim, ela não precisará contar para o dono de Adelmo que está cansada das aulas e ele não a convidará para uma viagem sem volta a Curitiba, Meca com a qual sonhara desde a era Lerner. O pior não foi o que não aconteceu, mas o desconhecimento daquilo que poderia ter acontecido. Não saber que a felicidade estava ali é mais triste do que a consciência de tê-la deixado escapar. Na esquina, as ruas se encontram e os planos se cortam. Amores também se perdem.

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