terça-feira, 19 de julho de 2016

George Simmel e o ensaio



Leopoldo Waizbort, ao dedicar um capítulo de "As aventuras de Georg Simmel" ao gênero ensaio, desenvolve algumas observações que julgo bastante pertinentes. Simmel talvez tenha sido um dos maiores ensaístas do final do século XIX e início do século XX. E é a partir de uma reflexão sobre sua obra, bem como uma análise do interesse de Simmel pelo ensaísmo, que Waizbort consegue reconstituir o pensamento do alemão em busca da construção de sua cultura filosófica. Seu pensamento pervive na obra de pensadores importantes como Adorno, Benjamin, Lukács, entre outros. 

"Movimento, subjetividade e experiência compõe a constelação do ensaio". Tal ideia é central em Simmel. Nesse caminho, o elemento associativo desempenha uma função importante: "Simmel nunca esgota seu objeto, e isto, claro está, é compreendido como uma virtude e não um defeito". Em outro momento, Waizbort escreve: "Se Adorno tem razão em apontar a estrutura e a origem musical do ensaio, esta só pode ser a da variação e do desenvolvimento. Com isso explica-se porque o ensaio é processo". E ainda: "(...) O ensaio é essencialmente descontínuo. Ele possui uma relação privilegiada com a vida, ao exprimir o fragmentário, imprevisto, movimentado, fugidio".


Simmel costumava lembrar de uma história bastante interessante em suas aulas. Citemo-la: "Em uma fábula um camponês à morte diz a seus filhos que há em suas terras um tesouro enterrado. Em consequência disso, os filhos escavam e reviram profundamente a terra por toda parte, sem encontrar o tesouro. Mas no ano seguinte a terra assim trabalhada produz três vezes mais frutos (...)" Tal é a lógica do ensaio. O passeio é mais importante que o ponto de chegada. O processo é mais importante que o produto. 

O voo é mais importante que o pouso: "Simmel afirmava que o importante não é ter encontrado algum tesouro, mas sim ter escavado. Tal comparação é semelhante ao passeio. Para quem passeia, o caminho e a paisagem são mais importantes que o ponto de chegada. Essa ideia é a própria ideia do ensaio e por isso ele foi, já tantas vezes, desde Montaigne, aproximado a um passeio que o autor faz e nos convida a acompanhar. Isto explica também o inusitado, muitas vezes, do ensaio, como se no meio do caminho se resolvesse tomar uma outra direção. Isto significa que não interessam tanto as conclusões a que um ensaio poderia levar ou que ele poderia trazer, mas sim o processo, o desenrolar do pensamento, o espírito que trabalha, em movimento aventureiro. O movimento é a característica básica do ensaio". Nesse sentido, o ensaio é pergunta e não resposta: "No ensaio, o principal não é convencer o Leitor de modo absoluto, mas sim indicar caminhos, fazê-lo pensar. Já que ele não comprova nada, sua principal tarefa é impulsionar o pensamento. O ensaio é mais dúvida do que certeza". Daí a ideia enfatizada por Waizbort de pensar o ensaio a partir da imagem da constelação. Interessa para o ensaio as relações curiosas travadas entre os objetos, as relações constelacionais. Essa forma diferenciada de conhecimento estaria intimamente ligada com o próprio advento da modernidade, cujo seio não abrigaria mais uma filosofia pautada pela noção de sistema, mas sim por uma cultura filosófica de cunho ensaístico. Simmel merece releituras.  

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