segunda-feira, 25 de abril de 2016

Mimoso Ruiz (da série Origens da poesia em Porto União da Vitória)



Alexandre Nogueira Mimoso Ruiz (1887-1951) é certamente uma das figuras mais curiosas e menos conhecidas da história de Porto União da Vitória. O poeta e jornalista era um português nascido em Lisboa, onde foi vice-presidente da Associação dos Trabalhadores da Imprensa de Lisboa. Em 1912, quando era redator do jornal A Nação, em Portugal, foi preso provavelmente por criticar a República recém implantada. Julgado em 1913, e condenado a dois anos de prisão, foi restituído à liberdade em 1914. Em 1922, transferiu-se para o Brasil com a finalidade de chefiar a delegação portuguesa nas comemorações do centenário da Independência do Brasil.
O poeta se instalou em Santa Catarina e interessando-se pela vida pública foi correspondente de guerra, cobrindo campanhas militares e incorporando-se como 2° Tenente voluntário à Força Pública, atingindo o posto de capitão. Em Florianópolis, dirigiu o jornal Folha Nova, lecionou na Escola Regimental Marechal Guilherme e nos cursos de Preparação Militar e de Aperfeiçoamento de Oficiais.



Pouco se sabe sobre a atuação de Mimoso Ruiz em Porto União. O que pode ser apurado é que ainda na década de 20, o poeta residiu na cidade, onde criou o jornal A Voz do Sertão, lançado em 13 de Abril de 1926. No periódico, que parece ter tido tendências políticas voltadas para o apoio a Victor Konder e a Washington Luiz, podem ser encontrados vários poemas do jornalista, que versam sobre temas variados. Em um deles, numa das dez quadras decassílabas, defende Anita Garibaldi: "Correr p'ra Garibaldi como um astro, / casar mais tarde, é ter perdido a linha? / Porventura se perdeu Ignez de Castro / a qual depois de morta foi rainha?".  Em outro, intitulado "Cantores Caboclos", de forma métrica relativamente livre, canta a sua paixão por uma cabocla. Trata-se de um poema que assimila, em um processo de obnubilação das origens portuguesas, o universo regional e popular do sul do Brasil, tanto no tema, na forma, como no vocabulário: "Ch'ucro na tropa / desta vida no rodeio / na mangueira dos teus braços / ando em busca de custeio // na herva-mate dos lábios seus / eu quisera morrer viciado / perdoe-me Deus // Oh quem pudera / ir tomar cheio de desejos / na cuia da sua boca / chimarrão feito de beijos". 
Na edição de número 12, veiculada em 4 de julho de 1926, Mimoso apresenta dois sonetos com temática polêmica. Em ambos, a igreja é o cenário de um encontro voluptuoso entre Cristo e uma fiel. No primeiro, intitulado "Jesus Crucificado", o poeta imagina ter visto uma troca de olhares entre Jesus e a moça, criticando tanto um como o outro pelo ato. O poeta se encerra com uma imagem no mínimo curiosa, A Virgem Maria sai de seu altar e se dirige ao filho para cobrar-lhe a falta. O segundo soneto, intitulado "Coração de Jesus", está diretamente ligado ao primeiro, funcionando como sua continuidade, depois da saída da jovem da igreja, o poeta volta à igreja e percebe que Jesus, com saudades da jovem, abandona o altar, deixando em seu lugar o Coração Sagrado. Trata-se de uma publicação bastante profanadora, principalmente em um jornal da pequena cidade de Porto União. Podemos imaginar a impressão de estranhamento ou revolta que pode ter causado entre os religiosos e fiéis que, por ventura ou desventura, leram A Voz do Sertão, naquele 4 de julho. Tanto um quanto o outro soneto fazem lembrar de alguns poemas de Cruz e Sousa como "Cristo de Bronze", que rebaixa a figura de Jesus, ao apresentá-lo como uma figura luxuriosa.





É provável que tenha residido também em Valões, tendo em vista que uma nota publicada na edição de número 8 do Jornal, de 06 de junho do mesmo ano, informou que Mimoso Ruiz, por ser forçado a residir em Porto União devido à publicação do jornal, solicitou ao chefe de polícia do Estado a sua exoneração do cargo de Delegado Especial de Valões. O pedido foi aceito.  

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