Na noite da
última sexta-feira (22), foi inaugurada na Galeria de Arte Erich Herbert Will,
em União da Vitória, a exposição “Religiosidade”, da artista plástica Salete
Strobino, que reúne uma série de quadros cuja temática perpassa o universo
sagrado das religiões. Em um mundo no qual impera cada vez mais a falta de
amistosidade entre crenças diferentes, bem como a falta de disposição para aceitar
a fé alheia com o decoro que lhe é necessário e devido, um evento como este não
apenas nos oferece uma oportunidade de deleite – o que a boa arte sempre faz -,
mas também nos convida a uma reflexão sobre o momento crítico que atravessamos,
no que se refere ao preconceito contra variadas práticas religiosas e a
consequente falta de liberdade de cultos. Digo que essa reflexão é cada vez
mais fundamental num mundo cada vez mais fundamentalista.
No discurso de
abertura da exposição, em meio a um clima místico e de profundo encantamento, a
pintora falou com beleza sobre a importância da fé sem preconceito, da
tolerância como motor do bem viver, da religião como forma de religação do
homem com o divino, o que está sugerido na própria etimologia da palavra. Tais
observações não apenas orientavam os presentes para uma compreensão mais
apurada das obras - favorecendo assim a leitura de cada um dos quadros -, mas
também criavam pelo axé que mora nas palavras de luz e pelo diálogo com as
pinturas uma força capaz de iluminar não apenas a exposição, mas também a
consciência dos espectadores.
De um lindo e
inusitado Jesus Cristo, pintado com inspiração na linguagem de 8bits, a um
retrato de Omulu, orixá africano que é o senhor das doenças e da cura (e que é
bastante cultuado no Candomblé), as obras nos apresentam uma pluralidade de
estilos, de temas e de perspectivas religiosas que dificilmente encontraríamos
em outro lugar a não ser na exposição. Uma bela representação de Nossa Senhora
Czestochowa pode ser apreciada na mesma sala que abriga uma exuberante e
colorida cabocla da Umbanda. Anjos, Budas, Deuses egípcios, Yabás africanas,
Ganesha, São Jorge, entre outros, fazem a festa de um Deus que ama a todos e
que a todos abraça. Esse Deus é arquiteto de muitas artes. Nesse sentido, a
exposição parece realizar um feito impossível (ou quase) no nosso mundo, que é
o de reunir e fazer conviver, respeitadas em suas diferenças, culturas
religiosas distintas. Não se trata de exigir que todas as religiões cultuem
todos os santos ou deuses, mas de apontar para a necessidade do respeito à
crença alheia, lançando-nos a sempre pertinente pergunta: “Como eu trato o meu
irmão e a sua fé?”
A constituição
garante a liberdade de culto, mas na prática assistimos ao apedrejamento de
candomblecistas e umbandistas, à destruição de terreiros, ao desconhecimento
que gera violência. É sempre bom conhecer antes de julgar, diz a máxima. Há
alguns dias, foram colados em postes de uma cidade catarinense cartazes em que
a imagem ameaçadora de um sujeito encapuzado da Ku Klux Klan era acompanhada
das seguintes palavras: “Negro, comunista, antifa e macumbeiro, estamos de olho
em você”. Algo está muito errado! Estamos de olho também em movimentos como
este. Destruir, aniquilar, silenciar o que “não faz parte do meu mundo e da
minha ideologia” não é fenômeno novo, mas parece ganhar nova força na
contemporaneidade. A exposição de Salete Strobino reflete com presteza também
sobre isso.
O evento,
promovido pela Secretaria Municipal de Cultura de União da Vitória em parceria
com a Associação de Artistas Plásticos do Vale do Iguaçu, ficará aberto para
visitação até sábado (30) na Galeria de Arte Erich Herbert Will, na Estação.
Caio Ricardo
Bona Moreira
publicado originalmente no dia 30 de setembro de 2017
no jornal O Caiçara, de União da Vitória
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