segunda-feira, 14 de abril de 2008

O FOTÓGRAFDO, O PARQUE, O THOMAS E O CLICK



FOTO 1
O fotógrafo entrará no parque. Ainda será dia. As luzes, paraísos artificiais, ainda não estarão acesas. O fotógrafo ainda não chegou ao parque. Enquanto circulará com o automóvel pelos arredores da cidade, lembrará do Thomas. O Thomas, do Antonioni, aquele que topa a parada de um jogo imaginário. A máquina fotográfica estará no banco de trás. Ele lembrará que decidiu ser fotógrafo depois que conheceu o Thomas. Decidiu “ser”, só isso, como se acreditar que a existência pudesse ser decidida fosse possível. Ser é só uma opção ou um campo de possibilidades, não é assim?

FOTO 2
O fotógrafo não dormirá esta noite. Ele não sabia. Quem morre dorme para sempre ou nunca mais dorme? Ele morrerá esta noite, mas ainda não sabe nem como será. Depende do ponto de vista, pensou ele, lembrando do Thomas. Ele poderia ter decidido outra coisa. Poderia ser estilista, já que gostara bem mais das roupas do filme. Poderia virar um músico, já que gostara bem mais das músicas do filme. Não, ele virou um fotógrafo. Ele não morreria mais esta noite. Pelo menos não por vontade própria. Ele não sabe. Talvez mudasse de idéia.

FOTO 3
O fotógrafo ligará para a mãe lá pelas dez da noite. Pedirá a sua benção, mesmo não acreditando em anjos ou demônios. O céu e o inferno é todo mundo. O fotógrafo falará com a sua companheira de quarto antes de ligar para a mãe. Ela pedirá para ele escolher para ela uma das roupas que deve usar para a sessão de fotos. A mãe ou a moça? A moça. Ele pedirá para que ela tire a roupa e ela tirará, só para agradá-lo. Assim ele pensa. Assim ele tira mesmo as fotos. Será?

FOTO 4
Teria sido um parque da cidade, daqueles só com árvores e namoros escondidos e um possível assassinato? Terá sido um parque de diversões. O fotógrafo pensará que as confusões geradas pelas imagens são sempre menores do que aquelas geradas pela palavra. Quem inventou a palavra parque? Ah, essa palavra fantasia.

FOTO5
O fotógrafo chegará ao parque antes do anoitecer. Contará as moedas no bolso, sem, no entanto, tirá-las. Contará para a sua companheira de quarto que contou todas as árvores do parque, ou os bichos do zoológico, ou os assentos da roda-gigante. Quem saberá? Contará tudo e depois nunca mais encostará seus dedos da sua máquina fotográfica. Preferirá a máquina do mundo, ou a máquina de escrever, ou a máquina de pensar. A máquina repensada. Roda moinho, roda peão. O rei da brincadeira é José, o rei da confusão é o João. Desligará o rádio do carro. Enfim ,entrará no parque.

FOTO 6
É no parque que a vida acontece. Enquanto as fábricas funcionam regularmente, assim como nossa máquina corporal, o parque, naquele seu silêncio quase absoluto, contará todas as novidades para o fotógrafo. Preciso inventar uma fantasia para destruir meu tédio. Que tal um assassinato? Eu vou até ele, estrangulo-o, volto para a entrada, entro novamente, deparo-me com um corpo, assusto-me. Tento descobrir quem é o homem, quem é o assassino, o motivo para tal acontecimento e o motivo que me levou até ele. Depois tiro uma foto. Quem sabe forjando minhas próprias imagens, eu não possa abandonar a minha máquina de pensar. Click!
Caio Ricardo Bona Moreira
publicado originalmente em

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